Liderando em tempos de mudança

Liderando em tempos de mudança

Deu no The Economist: “As escolas de negócios deveriam rever seus currículos. Quando descobrimos que a maior parte dos executivos que protagonizaram a crise de 2009 eram oriundos das principais Business Schools do mundo, percebemos que alguma coisa está errada, muito errada. Se elas ensinassem história a seus alunos, por exemplo, estes evitariam os erros já cometidos anteriormente”.  

 

De fato, nos últimos 50 anos houve mais de uma centena de crises no sistema financeiro (nenhuma tão grave, claro), e todas tiveram origens parecidas. Conhecer os erros e os acertos de quem veio antes de nós é, no mínimo, uma forma de ajuda aos processos de tomada de decisão. Mas pouca gente se interessa por história. Pena.

 

E seria fácil. Faça o seguinte: pegue um livro de história universal do colégio de seu filho e dê uma olhada. Ou compre uma das publicações do Laurentino Gomes sobre história do Brasil e delicie-se com os fatos da vinda da família real em 1808 e da independência em 1822.

Em qualquer dos casos você vai verificar o seguinte: primeiro, que estudar história é estudar os movimentos de mudança da humanidade, como as conquistas, os descobrimentos, as crises e as invenções. Segundo que não nos debruçamos sobre esses fatos sem verificar quem foram seus protagonistas, aqueles que estiveram à frente dessas mudanças, as promoveram ou, de alguma forma, influenciaram os fatos. Esses foram os líderes. E não importa se eram reis, generais, comandantes ou simples homens e mulheres do povo. Lideres são os que promovem mudanças. Ou, pelo menos, lidam com elas.

 

Sim, para gerir as mudanças cada vez mais frequentes e profundas, e seus casos especiais, como as crises e os grandes desafios da atualidade, são necessários lideres bem preparados, dotados de visão sistêmica, competência estratégica, poder de decisão e, acima de tudo, resiliência.

 

É bem sabido que os líderes mais apropriados aos tempos de guerra são diferentes daqueles que administram a paz. Churchill, por exemplo, não foi reconduzido ao primeiro gabinete depois da Segunda Guerra Mundial. O homem que havia livrado o mundo da tirania simplesmente não era a pessoa mais indicada para a reconstrução. Agora seria necessário um líder com perfil de gestor, um empreendedor, e não um guerreiro. O escolhido foi o conciliador Clement Attlee, mas Winston Churchill voltou em 1951 para controlar o declínio econômico do império – uma nova batalha.

 

OK, e que tipo de líderes estamos precisando em nossas empresas? Afinal estamos paz ou em guerra? Bem, depende do ponto de vista. Em termos absolutos,  vivemos tempos de paz, felizmente. Pelo menos não há nenhuma guerra em nosso quintal, e esperamos que assim continue, por muito tempo.

 

Mas, em termos relativos, considerando as disputas de território de um mercado globalizado, os solavancos da economia europeia, a força dos emergentes, o acirramento da competitividade, não dá pra dizer que não estamos em um certo “estado de guerra”. Revisão de cenários, estratégia de conquista, logística, comunicação, capacitação do time. Tudo isso é necessário para, às vezes, ganhar alguns metros de território. Que tempos são esses, em que a paz exige operações de guerra?

 

O autor do artigo da revista inglesa tem razão. É hora de revermos a maneira como estamos produzindo os líderes que irão construir o futuro. Para estes, competências funcionais são apenas um detalhe. Fundamental, mas não mais do que uma parcela de sua formação, que atualmente exige a compreensão da evolução social, o entendimento das variáveis econômicas, as características comportamentais das novas gerações, as exigências crescentes do mercado e assim por diante.

 

Conhecer história, como ele sugere, é apenas parte do processo. Mais do que conhecer história é necessária a disposição para participar de sua construção. Há quatro séculos o Padre Antônio Vieira disse: “Contar a história do passado é fácil. Quero ver é você contar a história do futuro, do que ainda está por vir. Quando fazemos isso estamos mostrando nossa disposição para sermos como deuses”.

 

Sem o exagero semântico do padre filósofo poderíamos dizer, sem medo de errar, que os novos líderes gostam, sim, de brincar de seres capazes de ver o que os demais não veem. E não vai nisso nenhuma arrogância nem prepotência, e nem sequer é uma competência especialíssima. Trata-se apenas de uma qualidade dos líderes que se forjam e agem em tempos especiais, os tempos de grandes mudanças, como o que estamos vivendo nestes dias.