Mudar o que mesmo?

Mudar o que mesmo?

Há algo de errado com a premissa de que é preciso transformar tudo radicalmente o tempo todo

A mudança é filha da insatisfação, dizem. E o que não falta são motivos para querer mudar, pois a modernidade trouxe a velocidade como uma de suas marcas, e aquilo que nos satisfazia há pouco já não atinge seu objetivo com facilidade. Clientes só ficam satisfeitos quando percebem melhoria no serviço, chefes só se satisfazem com funcionários que evoluem, e até namoradas preferem namorados que continuam surpreendendo-as. A vida é difícil.

Essa percepção chegou ao mundo da gestão das empresas com intensidade redobrada, pois aqui há negócios e carreiras em jogo. Mudar passou de bispo  a rainha no xadrez corporativo. Afinal, um mundo mutante exige ação, velocidade de resposta, novas propostas. Mudanças. Mas – perguntam os mais cautelosos – mudar o que mesmo? Perguntas simples costumam ser desconcertantes, pois elas são feitas por alguém que teve a coragem de dizer que não está entendendo, enquanto a maioria não quer admitir que está perdido na discussão, apesar do semblante inteligente.

O grande problema das mudanças inovadoras que elevam o patamar de competitividade, é que, em geral, não estão no lugar para onde olhamos. Na imensa maioria das vezes, o que precisa ser mudado não é o que, mas o como. Observe como a maioria das tentativas frustradas de inovação propunham mudanças radicais, grandes demais para não desestabilizar o negócio ao ser implementada.

Os esportes costumam ser bons exemplos de alto desempenho, pois os treinos estão criando novas gerações de atletas contra os quais os campeões de antigamente não teriam a menor chance. Entretanto, as regras desportivas mudam muito lentamente. Não é o jogo que muda, mas a maneira como se joga.

Antigamente, por exemplo, os jogadores de basquete plantavam os pés bem firmes no solo para então efetuar o lançamento com força e estabilidade. Era assim que se jogava. Até que o jovem Hank Luisetti, do time de Stanford, começou a desestabilizar os adversários lançando a bola com uma mão só enquanto seu corpo ainda estava em pleno ar. Nenhuma regra dizia que não se poderia jogar assim, apenas era tão estranho que parecia errado. De lá para cá o que assistimos foi uma evolução do estilo voador. Ele não mudou o que se fazia – colocar a bola no aro – apenas mudou a jeito de fazer isso. E deu super certo, lembre do Michael Jordan, para ficar em um exemplo lustroso.

Na próxima reunião de turnaround (que pode ocorrer só entre você e seu travesseiro), pense se é necessário mudar o que você está fazendo, ou apenas aprimorar o estilo. A surpresa pode ser grande.

Texto publicado sob licença da revista Você S/A, Editora Abril. Todos os direitos reservados. Visite o site da revista: www.vocesa.com.br